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A importância das emoções no amadurecimento dos jovens (e em Divertida Mente)

  • Foto do escritor: Julia Portilho
    Julia Portilho
  • 30 de jun. de 2024
  • 7 min de leitura
Um compilado de imagens de Riley em diversas situações da vida, como comendo e indo para a escola
O sucesso da premissa de Divertida Mente é comprovado pela aclamação da crítica e público. Foto: MovieDetails/Reddit

Recém estreado nos cinemas com sua continuação, Divertida Mente continua provocando debates mesmo quase uma década depois de seu lançamento. Pode soar estranho, mas precisamos de todas as emoções na nossa vida. 


Reconhecida como uma doença pela Organização Mundial da Saúde e frequentemente chamada de mal do século XXI, a depressão tem provocado debates importantes na sociedade, principalmente sobre as emoções dos jovens. Uma em cada dez pessoas entre 5 e 24 anos tem ao menos um transtorno mental diagnosticado, segundo dados de um estudo publicado pela revista JAMA Psychiatry em fevereiro deste ano.


Isso mostra como é essencial tratar de assuntos relacionados à saúde mental o quanto antes na vida de uma pessoa. Indo para o universo da ficção, em Divertida Mente, Riley passa por mudanças bruscas em sua vida sem ter o devido acompanhamento ou apoio para enfrentar as dificuldades nesta passagem da infância para adolescência.


A psicóloga e especialista em educação e aprendizagem, Noemi Moreno, tem experiência na Terapia Cognitiva Comportamental e trata de pacientes a partir da compreensão e interpretação do mundo ao redor e como reagem a seus estímulos. Ela aponta como o cérebro dos jovens passa por muitas mudanças, o que pode influenciar sua maneira de pensar, agir e sentir. 

Riley, com uma expressão de susto e apreensão, segura a carteira da mãe na mão, pegando um de seus cartões
A desregulação das emoções de Riley afeta seu comportamento e provoca ações extremas que não seriam tomadas em situações de equilíbrio emocional. Foto: Disney/Pixar

Ela explica que, “durante essa fase (transição da infância para adolescência), o córtex pré-frontal, responsável pelo planejamento e controle de impulsos, ainda está se desenvolvendo, enquanto o sistema límbico, que regula as emoções, está altamente ativo. Isso pode resultar em maior reatividade emocional e dificuldade em tomar decisões racionais”. É uma fase que representa a completa transformação de seus corpos e personalidades.


De forma muito didática, o filme evidencia como todas as emoções são essenciais em situações diferentes da vida. Temos uma amostra de como a tristeza, por exemplo, é vital para aprender a lidar e entender os outros sentimentos. Até mesmo nos contos de fadas as mocinhas precisam enfrentar momentos tristes para ter um final feliz - que pode até não existir na vida real, mas que se torna uma busca constante ao longo da trajetória humana.


A vida não é feita só de momentos felizes. É irônico o quanto é difícil notar isso no dia a dia quando percebemos, ao longo do filme, como a alegria pode ser inconveniente ao não deixar Riley ficar triste com a mudança de cidade e as consequências que isso trouxe. É inevitável ficar triste uma hora ou outra, o que conta é o que você faz com isso. 


Mas afinal, o que são as emoções?

De acordo com o psicólogo David G. Meyers em seu livro "Psicologia", as emoções são compostas de três elementos principais: reações físicas, expressões comportamentais e experiências conscientes. 


As emoções podem influenciar o comportamento de uma pessoa de maneira positiva ou negativa. As emoções positivas, consideradas saudáveis, promovem bem-estar e favorecem a forma de pensar, raciocinar e agir. Por outro lado, emoções negativas, como a tristeza e o medo, têm um efeito tóxico no bem-estar pessoal e costumam quererem ser evitadas. 


No entanto, essas emoções não são prejudiciais, desde que em baixa intensidade. Apesar de serem dolorosas, fazem parte do aprendizado e crescimento pessoal. Elas ajudam a construir a memória emocional ao lembrar das consequências de certos comportamentos.

As emoções servem para a comunicação entre membros de uma mesma espécie ou entre espécies diferentes. Por exemplo, isso é evidenciado na cena do filme do jantar em família, quando as emoções do pai, da mãe e de Riley estão interpretando os sinais emocionais emitidos por cada um para se comunicarem.



Charles Darwin foi o primeiro a apontar a hipótese de que as emoções eram parte da natureza de animais e humanos, lá em 1876. Desde então, o tema tem sido abordado de diversas formas. O consenso é a importância de aprendermos a ler as emoções e processá-las como uma maneira de melhorar nossa qualidade de vida e convívio em sociedade.


A empatia como peça chave

O livro Emocionário, de Renato e Marina Caminha, ilustra como a empatia é uma peça chave para permitir vivermos em uma sociedade segura e tolerante. A capacidade de se colocar no lugar do outro e de perceber o que ele está sentindo ajuda a promover a compreensão e a validar as emoções, sejam de nós mesmos ou do outro. 


Para Noemi, sejam positivas ou negativas, as emoções são uma parte intrínseca da experiência humana. As emoções negativas, como raiva e tristeza, por exemplo, “nos ajudam a lidar com perdas e injustiças, enquanto emoções positivas, como alegria e amor, nos motivam e dão significado às nossas conquistas” , esclarece.


Tristeza está com as mãos no painel de controle das emoções de Riley olhando para a Alegria.
A "Tristeza" desempenha um papel fundamental na compreensão de emoções complexas e adversas. Foto: Disney/Pixar

Isso se torna mais claro com a própria moral da história de Divertida Mente. No final, a alegria percebe a importância, não só da tristeza, mas de todas as emoções para a regulação e bem-estar de Riley. Ao aceitar todas as emoções, estamos desenvolvendo a empatia consigo mesmo e com o próximo.


Então, por que sentir emoções negativas?

Porque acredite, quando experimentadas em baixa intensidade podem trazer benefícios para nossa vida. A psicóloga exemplifica como a tristeza pode levar a uma maior introspecção e autoconhecimento: “além de aumentar a nossa empatia e capacidade de nos conectar, às vezes emocionalmente com os outros, ela também nos ajuda a valorizar mais os momentos felizes, servindo como um catalisador para mudanças positivas em nossas vidas”, afirma.


A fala de Noemi é descrita com clareza na cena em que Riley volta para casa e enfim se permite sentir todas as emoções vinculadas à mudança de cidade. É necessário se permitir sentir, passar por este momento, para, assim, se recuperar de forma eficaz e completa.


“Eu costumo falar para os meus pacientes o seguinte: tudo passa. A tristeza passa, mas a felicidade também. E que muitas vezes a gente passa por momentos difíceis, às vezes momentos tristes, mas isso vai nos motivar a buscar algo para nos deixar felizes, a buscar uma mudança de vida”.

Riley e seus pais estão ajoelhados no chão se abraçando.
Quando a "Alegria" enfim percebe a importância da "Tristeza", Riley volta para casa e se abre com seus pais. Foto: Disney/Pixar

É como se as emoções negativas construíssem um grande histórico em nossa memória. Ao enfrentar uma situação de perigo, esse backup é acionado e nos prepara para passar pelas adversidades. Ninguém quer sentir medo ou tristeza, mas é inquestionável o papel que desempenham em nosso processo de amadurecimento.


O desafio então é como ajudar jovens a lidarem com essas emoções negativas de modo saudável. Para Noemi, um dos passos mais importantes é desenvolver a educação emocional, já que ela “ensina a identificar e nomear as emoções e expressá-las de maneira adequada", explica.


Além disso, estimular habilidades de coping, que são o conjunto de estratégias para ajudar a lidar com situações adversas. Alguns exemplos incluem técnicas de respiração e mindfulness, também pode ajudar os jovens a gerenciar o estresse e a ansiedade. A ansiedade é, inclusive, uma das novas emoções apresentadas na sequência da animação, que estreou no último dia 18 nos cinemas nacionais. 


Os índices de ansiedade entre crianças e jovens superou os de adultos pela primeira vez no Brasil, de acordo com reportagem da Folha de S.Paulo. Não existe uma causa única para o aumento, mas alguns motivos são apontados para a piora na saúde mental dos jovens, como o uso excessivo de celulares e jogos, crises econômicas e autodiagnósticos simplistas.


Uma rede de apoio, uma rotina de exercícios e hábitos saudáveis pode ajudar a aliviar os sintomas no dia a dia. A expressão criativa, como arte, música e escrita, também é incentivada como uma forma de processar as emoções. Lembrando que a ajuda profissional é a melhor alternativa para lidar com os problemas de saúde mental.


A relação das emoções com a memória

"Alegria" está de pé encarando as diversas torres que armazenam as memórias de Riley.
O filme ilustra de forma muito interessante como as memórias são armazendas em nosso cérebro, separando inclusive pela cor da emoção predominante. Foto: Disney/Pixar

A curiosidade é um fator importante para entender como a mente funciona e como lidar com os desafios da sociedade atual. Então como funciona a interação entre as emoções e nossas memórias?


Como já mencionado, as emoções desempenham um papel fundamental na formação e recuperação de memórias, influenciando nas decisões futuras. Noemi explica que essa “interação entre emoções, memórias e decisões é complexa e multifacetada, envolvendo diversos processos cognitivos e neurológicos. Emoções intensas, sejam positivas ou negativas, tendem a resultar em memórias mais vívidas e detalhadas”.

“Emoções ajudam a determinar a importância de uma memória. As emoções não apenas moldam a maneira como lembramos dos eventos, mas também influenciam nossas escolhas futuras, nos ajudando a navegar pelo mundo de maneira mais eficiente e adaptativa”.

As emoções no processo educacional

Aprender a lidar com as emoções é essencial, mas é igualmente necessário que a sociedade esteja preparada para apoiar adequadamente aqueles que enfrentam problemas de saúde mental. No Brasil, por exemplo, um dos maiores desafios é a falta de conscientização sobre o assunto, além do financiamento insuficiente dos programas de apoio.


Como psicóloga, Noemi reconhece o avanço, mas destaca que ainda há muito a ser feito. Para ela, “ainda existe uma falta de conhecimento, um estigma sobre a saúde mental, sobre educação emocional, do quanto é importante. Além disso, a necessidade de informação e capacitação adequada dos educadores e a dificuldade de integrar esses programas em currículos que já são sobrecarregados”, reforça.


Uma das especialidades de Noemi é justamente o campo educacional, e, por isso, acredita que para conseguir atender, principalmente, os jovens de maneira adequada é preciso aumentar a conscientização sobre a importância da educação emocional. Para isso, é necessário investir na formação contínua dos educadores.


Em casa, as famílias devem incentivar a comunicação aberta e honesta, onde todos se sintam valorizados e ouvidos. Noemi considera que a empatia pode ser praticada nesses momentos. Ao “oferecer suporte mútuo você pode fortalecer os laços familiares e criar um ambiente de confiança. Atividades conjuntas e momentos de qualidade são importantes para construir conexões significativas, como por exemplo assistir um filme juntos, jogar jogos, cozinhar”, exemplifica.


Todos temos emoções

As cinco principais emoções estão de costas olhando para as ilhas da mente de Riley,
No final do dia, todas as emoções são importantes para a manutenção de uma vida saudável e equilibrada. Foto: Disney/Pixar

Divertida Mente é uma animação que comove pela identificação. É fácil se ver representado na tela, mesmo que por uma garotinha entrando na adolescência.


O sucesso do filme pode ser interpretado como um ótimo gancho para se falar das emoções nas famílias, escolas e outros ambientes sociais. Ao mostrar de forma lúdica como as emoções funcionam, o longa da Disney conquista a atenção do público e ensina uma história emocionante de amadurecimento e autoconhecimento.


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