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A representação feminina no live action de Mulan

  • Foto do escritor: Letícia Anacleto
    Letícia Anacleto
  • 18 de mar. de 2021
  • 5 min de leitura

Mulan (2020)

Para ser considerada uma princesa da Disney, existe a regra de que a personagem precisa nascer princesa, se casar com alguém da realeza ou cometer um ato heroico. A última regra foi criada especialmente para Mulan, que não nasceu na realeza e nem se casou com algum príncipe, se encaixar dentro do seleto grupo das princesas. A jovem salvou o Imperador da China quando ninguém a apoiou, dentro de uma sociedade machista, com toda sua garra e coragem de mulher.

Enquanto na animação Mulan não possui nenhuma habilidade de luta e vai adquirindo durante os treinamentos da guarda ao som de “Homem Ser”, no live action a heroína já nasce com um dom. O Chi é uma força interior que se refere à energia vital de cada pessoa, o que dá a Mulan a predisposição para desenvolver suas habilidades de luta desde cedo. Apesar disso, mulheres que possuem esse dom devem reprimi-lo por não ser bem visto na sociedade.

"Seu Chi é forte Mulan, mas o Chi é para guerreiros, não filhas. Logo você será uma jovem mulher, então eu preciso que você esconda o seu dom, que silencie a voz dele", diz o pai de Mulan para a garota.

Quando seu pai é convocado para a guerra, Mulan, se passando por homem, veste uma armadura, empunha a espada da família, monta em seu cavalo e parte rumo à base de treinamento de soldados. Mesmo correndo o risco de ser descoberta e levar desonra para sua família, a garota não hesita em sua decisão de salvar o pai, que debilitado, provavelmente morreria na guerra.


Como a mulher é vista na sociedade


Mulan tem seus dons reprimidos desde criança pela família, que tem medo da jovem ser acusada de bruxaria por ter habilidades que são permitidas apenas aos homens. O filme se passa em uma sociedade extremamente machista, que acreditava que a mulher deveria priorizar o casamento acima de tudo.

Para satisfazer sua família e não permitir que fofocas sobre seu nome circulassem na vila, a protagonista adota o comportamento de recatada, educada e submissa. Ela acaba aceitando seu destino indesejado e se apresenta à casamenteira, pois já não via mais esperanças de fazer o que realmente sonhava: ser ela mesma, uma guerreira. Apesar disso, Mulan acaba mudando seu destino e partindo para a guerra.

Já no campo de treinamento, agora como Hua Jun, o filme mostra a visão que seus amigos homens têm das mulheres. Em uma conversa sobre o tipo de mulher ideal de cada um, os soldados dizem coisas como “ela tem que ter quadris largos” e “deve saber cozinhar”, ao invés de ressaltar qualidades que realmente importam.

Isso deixa clara a visão limitada que os homens têm das mulheres e mostra, ainda, como a falta de diálogo pode causar isso. “Eu não sei nem como falar com uma mulher, como é que eu vou me casar com uma”, é o que diz Chen Honghui, amigo mais próximo de Hua Jun, sem nem mesmo saber o quão simples era, afinal, ele estava falando com uma moça naquele exato momento.

“O meu ideal de mulher é corajosa, com senso de humor e esperta”, Hua Jun (Mulan) diz em conversa com seus amigos do regimento.

União feminina


Xianniang, chamada de “bruxa” no decorrer de todo o filme, é vista, inicialmente, como uma ajudante de Bori Khan. A mulher tem poderes muito fortes e, além de poder se transformar em águia e controlar as ações de outras pessoas, também possui um Chi muito forte. Suas habilidades são afirmadas com maestria em cenas de luta contra alguns soldados da guarda.

A mulher, assim como Mulan, reprimiu seu dom durante toda sua vida e desejava viver em um lugar onde seus poderes e sua força não fossem vilanizados. Por almejar a aceitação da sociedade e cansada de ser vista como uma bruxa má, ela se une ao vilão, com a promessa de ser acolhida quando ele fosse o líder da nação.

O termo “bruxa” é usado o tempo todo para desvalorizar o Chi feminino e reprimir as mulheres guerreiras. Homens se sentem ameaçados por mulheres fortes e, por isso, demonizam qualquer ato em que elas possam se sobressair contra eles. Por fugir do padrão imposto pela sociedade, Xianniang foi oprimida durante toda sua vida e mesmo após se juntar a Bori Khan, que era sua única esperança de ser aceita, ainda era tratada com desdém.

“Você se provou útil, bruxa”, diz Bori Khan para Xianniang.“-"Bruxa não, guerreira”, responde a mulher.

Xianniang em cena de luta













Xianniang tenta persuadir Mulan para que elas unam suas forças contra o Imperador, dizendo que também tentou seguir um caminho nobre e só foi rejeitada, mas a jovem permanece firme e leal a seu país, rejeitando a proposta. Também é ela quem mostra para a protagonista que "o disfarce a enfraquece e envenena o seu Chi” e faz a garota entender que ela deve ser verdadeira sobre sua identidade para, assim, ser mais forte.

Apesar de tudo, no final do longa, a feiticeira decide apoiar Mulan, levando-a até o local em que o Imperador era mantido como refém. Quando uma flecha é disparada na direção da menina, em um ato de sororidade, Xianniang decide se colocar na frente e é atingida no peito, morrendo nos braços de Mulan.


Lealdade, coragem e verdade


No decorrer de todo o filme, Mulan passa por vários “testes”, que poderiam fazê-la se revoltar ou desistir de tudo, mas ela não o faz. Ela tem que esconder seu corpo feminino por grande parte do tempo e, para isso usa faixas no peito, engrossa a voz e não pode, nem mesmo, tomar banho.

O longa-metragem deixa claro como esconder seu verdadeiro eu afeta a jovem. Um Chi encoberto é mais fraco, portanto Mulan só ascende como uma verdadeira lutadora quando tem a coragem de se revelar como mulher para seus companheiros de guerra, mesmo sabendo que iria ser desprezada por isso.

Ao se revelar, a garota tem que enfrentar sozinha a rejeição de seus amigos e de seu comandante, que a manda embora imediatamente. Apesar de tudo, ao descobrir sobre o plano do vilão Bori Khan de despistar as tropas para chegar até a Cidade Imperial e executar o Imperador, Mulan volta correndo, sem hesitar, e passa a informação para sua tropa.

Chegando na cidade, a protagonista enfrenta sozinha o vilão Bori Khan, salvando a vida do Imperador e provando para o líder e para a sociedade que uma mulher pode sim ser uma grande guerreira. Recebendo todos os méritos e reconhecimentos por seus atos de bravura, Mulan decide voltar para casa e, dessa vez, enfrentar uma possível decepção de sua família.

Acolhida por seu pai, a quem demonstrava muito respeito, a garota se sente finalmente completa por não precisar mais esconder seu dom para o mundo. Com o reconhecimento da sociedade, a aceitação de sua família e uma vaga para comandante da guarda real (no final, o filme deixa subentendido que ela aceita o trabalho), Mulan alcança plenamente os três pilares de um guerreiro: “lealdade, coragem e verdade”. Além disso, ela recebe mais uma virtude, que é gravada em sua espada como "devoção à família".

"E o broto então floresceu. E seus ancestrais a celebram em sua morada celestial. A garota se tornou soldado. A soldado se tornou uma líder. E a líder se tornou uma lenda"


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